Redes sociais vendem fórmulas de produtividade e organização, mas a verdade é que cada pessoa funciona de um jeito
A internet está cheia de promessas milagrosas: “acorde às 5h da manhã”, “escreva um diário todos os dias”, “não pegue o celular antes de meditar” e diversas outras orientações.
Embora esses hábitos possam funcionar para algumas pessoas, a verdade é que não existe uma rotina perfeita que possa ser aplicada a todas as realidades, e tentar se encaixar em padrões inalcançáveis pode gerar frustração, ansiedade e sensação de fracasso.
Mais do que seguir um cronograma pronto, o ideal é entender suas reais necessidades, sua própria realidade e o tempo disponível para realizar cada tarefa. A rotina não deve ser um castigo, ela precisa ser uma ferramenta da sua saúde física e mental.
A ideia de “rotina perfeita” e a comparação
O conceito de “rotina perfeita” ganhou força após a disseminação da cultura da alta performance e da produtividade máxima, reforçada por influenciadores que, geralmente, falam sobre saúde, bem-estar e o mundo fitness.
O grande problema é que essa ideia parte do princípio de que existe uma fórmula universal para atingir esse patamar – o que não é verdade.
Cada pessoa tem um ciclo do sono específico para repor as energias, uma realidade social, um ritmo biológico e diferentes demandas diárias, tanto pessoais quanto profissionais. Comparar sua rotina com a de alguém com outra rotina de trabalho, outra estrutura familiar ou outras prioridades é a receita perfeita para se frustrar.
Além disso, muitos desses modelos divulgados nas redes sociais não mostram os bastidores: os conteúdos possuem filtros, edições e um recorte específico da realidade.
O que é uma boa rotina, afinal?
Uma boa rotina é, simplesmente, aquela que funciona para você. É uma rotina que respeita seus limites, que se adapta facilmente aos imprevistos e traz uma sensação de ordem e autocuidado, e não de inflexibilidade e culpa.
Ela pode (e deve!) incluir:
- Momentos de descanso conscientes;
- Flexibilidade para ajustar horários;
- Tempo de qualidade para o que é importante pra você;
- Agir com gentileza consigo mesmo quando algo sai do planejado.
A rotina do brasileiro comum é diferente do que se vê nas redes sociais
Enquanto a internet mostra rotinas impecáveis, com treinos matinais, alimentação 100% saudável, meditação ao nascer do sol e alta produtividade, a realidade da maioria dos brasileiros está muito longe disso.
Segundo um levantamento do IBGE realizado em 2022, três a cada quatro brasileiros no país trabalham mais de 40 horas por semana. Muitas pessoas ainda enfrentam jornadas exaustivas, deslocamentos demorados e o cansaço extremo desencadeado pelo acúmulo de funções domésticas.
Um levantamento da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) mostrou que 14,9% dos adultos no Brasil se sentem, na maior parte dos dias, cansados ou sem disposição, sintomas que são o reflexo de rotinas puxadas, noites mal dormidas e pouco tempo para o autocuidado.
Para mulheres, a situação é ainda mais difícil: elas dedicam, em média, 21,3 horas semanais a atividades domésticas, quase o dobro do tempo que os homens, de acordo com o IBGE. E a rotina divulgada nas redes sociais muitas vezes não contempla as dificuldades invisíveis de milhares de famílias brasileiras.
Em outro contexto, influenciadores e criadores de conteúdo frequentemente mostram uma realidade bastante editada, que por meio das redes parece simples de ter, mas que é, majoritariamente, sustentada por redes de apoio, serviços terceirizados (como babás, cozinheiros, personal trainers), além de um trabalho que oferece flexibilidade de horário e autonomia.
Esse contraste de realidades cria uma falsa sensação de fracasso para quem não consegue repetir esse “modelo ideal”. Por isso, é preciso lembrar que sua rotina precisa fazer sentido para você, e não para performar para os outros.
Não existe produtividade sem saúde
Nos tempos modernos e digitais, é comum associar rotina à produtividade. Mas produtividade sem saúde física, emocional e mental não é sustentável a longo prazo. Ter uma rotina que ignora os sinais do corpo, sobrecarrega a mente e não inclui pausas pode gerar esgotamento a qualquer pessoa.
A rotina ideal é justamente o contrário disso: são bem estruturadas e personalizadas para contribuir com a prevenção de doenças, com o fortalecimento do sistema imunológico, com a qualidade do sono e até mesmo com o equilíbrio hormonal.
Mas como criar uma rotina possível?
- Respeite seu ritmo: nem todo mundo é produtivo de manhã; descubra os momentos em que você rende mais e organize suas tarefas – da mais simples à mais complexa – com base nisso;
- Estabeleça prioridades reais: em vez de encher sua agenda com tarefas que não são determinantes para seu crescimento, defina o que realmente importa para o seu dia, mesmo que sejam somente duas ou três tarefas;
- Inclua pausas e autocuidado: uma rotina não é moldada somente pelo trabalho. Momentos de lazer, descanso e desconexão também são essenciais;
- Seja flexível: imprevistos fazem parte da vida. Faça adaptações sem sentir culpa;
- Revise e faça ajustes sempre que necessário: sua rotina precisa acompanhar suas fases da vida. O que funcionava antes pode não funcionar agora – e está tudo bem.
Construa a sua própria rotina, não a dos outros
Ter uma rotina estabelecida não precisa ser sinônimo de rigidez, cobrança ou comparação. Ela deve ser uma ferramenta de organização que ajude a viver com mais saúde, bem-estar e equilíbrio, e sempre dentro da sua realidade, e não de acordo com uma vida mostrada por terceiros na internet.
Cada pessoa tem um contexto, uma história, um corpo e um ritmo diferentes. Por isso, a melhor rotina é aquela que respeita quem você é e onde você quer chegar com as tarefas realizadas diariamente.
Mais do que seguir fórmulas prontas, o verdadeiro autocuidado começa quando você se escuta, se acolhe e se permite adaptar a rotina quando necessário. A vida já é exigente demais. Então, que a rotina seja um espaço de respiro, e não mais uma fonte de pressão e estresse.